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Blog do Henrique Szklo

Prazer em aprender é o nome do jogo

Henrique Szklo

27/03/2018 04h00

Crédito: iStock

Acredito que não seja um grande segredo o porquê de o conceito de gamificação estar tomando cada vez mais espaço em todas as áreas relacionadas ao aprendizado e treinamento. O ser humano é uma espécie claramente motivada pelo prazer e pela competição. E parece que este fenômeno está cada vez mais se alastrando na sociedade contemporânea.

O excesso de informações e possibilidades ao alcance de todos tem, de fato, provocado uma grande ansiedade. Quero tudo e quero agora. Não tenho tempo para ficar ouvindo um professor falando uma hora sem parar. Quero que ele me passe seu conteúdo o mais rápido possível. E que, por favor, não exija nada de mim neste processo. Resumindo: não me encha o saco.

Não faz muito tempo, as pessoas sabiam que precisavam se sacrificar e fazer coisas das quais não gostavam para atingir um objetivo importante. O prazer, neste contexto, estava diretamente relacionado à conquista do tal objetivo e não à trajetória percorrida para atingi-lo. Primeiro a obrigação, depois o prazer. Hoje não. A impressão que dá é que as pessoas continuam ansiando por objetivos ambiciosos, continuam competitivas, talvez até mais do que antes, mas não estão nem um pouco dispostas a sacrificar seu tempo, paciência e disposição em atividades que não lhes tragam uma boa dose de prazer imediato.

No século passado, uma aula, em geral, era constituída de uma pessoa inquestionável falando sem parar para algumas dezenas de ignorantes entediados. E era bom que controlassem seu tédio e prestassem muita atenção naquele discurso chato, estudando em casa para poder absorver o máximo das informações passadas. Senão, pau. Em geral, não havia concessão para qualquer tipo de facilitação do processo, um pouco de diversão, uma gota de prazer, nada. Te vira, mané!

Quem começou, timidamente, a subverter esta norma opressora foram os cursinhos pré-vestibulares que introduziram o humor, a aula-show, o entretenimento como técnica de ensino, com resultados muito positivos. Porém, as escolas tradicionais continuaram refratárias, recusando-se a observar um modelo que para elas era vulgar ou uma mera brincadeira, sem valor, sem crédito, e que, portanto, de alguma forma desvalorizava a sagrada missão para a qual devotaram-se com tanto sacrifício.

Hoje, como não existem mais alunos e sim clientes –e os professores são meros prestadores de serviço, a mentalidade teve de mudar. Não se pode mais usar a palmatória ou exigir uma rígida disciplina, sob pena de receber uma visita ameaçadora dos pais do cliente. A única solução para quem quer mais vidas, tem sido utilizar a sedução no lugar da imposição. Inserir desafios estimulantes ao invés de obrigações. Provocar uma competição saudável, se é que existe isso, para dar um tempero especial ao processo. O conteúdo continua o mesmo, não tem porque mudar, mas a forma tem merecido um extreme makeover. O nome do jogo agora é entretenimento.

O game, que teve seus primeiros anos a fama de pária da sociedade e inimigo hediondo da educação, tem agora seu status quo modificado. De vilão a herói em poucos anos. Estudiosos começaram a perceber que as crianças evoluíam intelectualmente em função dos jogos. Que a competição e o desejo de vencer são estimulantes poderosos no desenvolvimento da criatividade.

Não demorou muito para alguém pensar por sete minutos e concluir que, ao invés de lutar contra o inimigo feroz, seria muito mais inteligente e proveitoso juntar-se a ele. A gamificação e seus derivados pedagógicos GFL (Game for Learning) e Edutainment, são hoje um fenômeno, mesmo ainda sendo incipientes se considerarmos percentualmente a aderência das instituições de ensino. Porém, acredito que não é apenas uma fase, mas uma via sem volta.

Gigantes do ensino como a Wharton School of Business, Harvard Medical School e MIT já contam com cursos gamificados. Eu mesmo já me curvei ao modelo criando um workshop nestes moldes e posso afirmar que a diferença entre o modelo formal e o baseado na lógica dos games apresentam resultados expressivos. Pode até ser que existam, mas até agora não encontrei nenhum efeito colateral negativo no processo.

O prazer é hoje material insubstituível em qualquer atividade humana. E uma sociedade hedonista tem sérias restrições ao pain versus gain. Portanto, sem querer ser futurista, acredito que em breve, as escolas e empresas de treinamento corporativo terão de se render ao inevitável. Do contrário, game over.

Sobre o autor

Henrique Szklo exerceu durante 18 anos a profissão de publicitário na área de criação, como redator e diretor de criação. Hoje é estudioso da criatividade e do comportamento humano, escritor, professor, designer gráfico, palestrante e palpiteiro digital. Desenvolveu sua própria teoria, a NeuroCriatividade Subversiva, e seu próprio método, o Dezpertamento Criativo. É coordenador do curso de criatividade da Escola Panamericana de Arte e sócio da Escola Nômade para Mentes Criativas. É colaborador também do site ProXXIma, tem 8 livros publicados e é palmeirense.

Sobre o blog

Assuntos do momento observados com bom humor pela ótica da criatividade e do comportamento humano. Sempre com um viés provocador e fugindo do senso comum. E que São Magaiver nos proteja!

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