Quando alguém morre, todo um universo é extinto

25.mai.2017 – Vereadora do PSOL Marielle Franco em seu gabinete, no Rio (Crédito: Rodrigo Chadí /Folhapress)
Preto, branco, rico, pobre, religioso, ateu, inteligente, ignorante, todos acumulam uma riqueza própria e profunda, fruto de uma experiência única, codificada e decodificada a partir de signos cognitivos, muito mais relevantes do que o simples julgamento de valores criado e cultuado pelo homem.
A morte é inevitável e necessária. Mesmo assim, me exaspero a cada finamento. E quanto mais jovem o universo, maior o meu desconsolo, mais larga a minha indignação com as arbitrárias leis da natureza.
Se o impacto do aniquilamento já é suficientemente brutal quando provocado por eventos aleatórios, quando um universo se apaga pela ação intencional de outro universo, fico aturdido com a ousadia de alguns em aniquilar uma rica história ainda por se contar. Em precipitar um universo cheio de informações e possibilidades rumo à inexistência.
A perversidade deste ato é tão desmedida, que suplanta de forma inequívoca a simples definição de crime. Em minha mente, adjetivos eivados de rancor se oferecem ao gosto do freguês: abjeto, hediondo, asqueroso, sórdido, torpe, repulsivo, obsceno… Não importa. Nada disso me redime. Não há como desabilitar um pecado.
Bebeto de Freitas morreu, Stephen Hawking morreu, Marielle Franco morreu. Universos de diferentes dimensões esvaziados por diferentes eventos: surpresa, inevitabilidade e covardia, respectivamente. A tragédia de universos famosos no mundo inteiro causa consternação generalizada, mas, foi o assassinato da jovem e combativa vereadora carioca que me machucou.
Eu não conhecia Marielle, por imperdoável ignorância de minha parte. Mas ao tomar conhecimento de seu assassinato e do motorista Anderson Pedro Gomes, imediatamente lembrei de quando tinha a idade deles. Consultei meu glossário mental e me desconsolei, como sempre, com a privação de experiências que uma morte prematura provoca. O quanto eles perderam. O quanto todos nós perdemos. Todo esforço e dedicação que os trouxeram até aqui.
Prostrado e impotente, sigo adiante, iludindo meu universo com a esperança frágil de que nunca serei vítima das iniquidades de universos obscuros e ignorantes de que estamos todos de alguma forma conectados. Indiferentes ao fato de que quando alguém extingue um universo, está criando buracos negros dentro de si mesmo.
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